Avançar para o conteúdo principal

A Aposta Francesa no Indo-Pacífico

 


    
    RITA DE BRITO
 demonstra como a França, ao longo dos últimos anos, tem reforçado a sua presença estratégica no Indo-Pacífico.

Descrita como a região mais populosa, dinâmica e estratégica do mundo, o Indo-Pacífico desafia as mais simples noções de cooperação internacional.

Muito rico em recursos, o Indo-Pacífico é o centro de comunicações marítimas mais importante do mundo, com uma estimativa de mais de metade (60%) de todas as trocas comerciais mundiais a passarem por esta zona, incluindo os tão estrategicamente importantes, petróleo e gás natural. Exatamente pela sua importância estratégica, é que muitas potências disputam o domínio desta região:

A China alega ter direito sobre grande parte do Indo-Pacífico, e tem, aliás, ao longo dos últimos anos, construído várias ilhas artificias para reforçar esta reivindicação, acusando ainda os EUA de se intrometerem, no que eles denominam, uma disputa meramente asiática. Os EUA, por seu lado, têm aumentado as tensões com a China ao patrulhar regularmente as águas Indo-Pacíficas com navios de guerra e meios aéreos, e também, por defender, a “Liberdade de navegação”.

A importância do Indo-Pacífico evoluiu largamente nos últimos anos, em resposta, sobretudo, a duas estratégias distintas. Por um lado, a projeção de poder marítimo chinês que acelerou espetacularmente desde a subida ao poder do Presidente Xi Jinping, e por outro, a crescente rivalidade EUA-China.

A França entra para esta equação pois, para além de ser uma importante aliada dos Estados Unidos, nomeadamente através da NATO, também possui importantes territórios no Pacífico, e, portanto, há vários anos que considera, como prioridades suas, a zona do Indo-Pacífico e a liberdade de navegação.

O facto de ser a única nação da União Europeia, (pós-Brexit) com significativa presença no Indo-Pacífico (devido aos seus territórios ultramarinos), explica o porquê de Paris ter um grande interesse nos assuntos de segurança da zona. Para além de pretender proteger os seus cidadãos e territórios ultramarinos, a França tem ainda como objetivos assegurar a segurança marítima, proteger as importantes rotas de trocas e defender os valores da ordem internacional. Deste modo, conta com uma grande frota militar (segundo standards europeus), e tem aumentando progressivamente as suas operações na região.

Certo é, que os territórios ultramarinos franceses colocam a região do Indo-Pacífico no centro da estratégia nacional do país e dão à França uma importante voz no grande debate em termos da região. Os interesses franceses em torno do Indo-Pacífico incluem a segurança e a proteção, nomeadamente no que diz respeito a assuntos como tráfico, a proliferação nuclear e terrorismo. A sua grande capacidade de influência estratégica, política e económica nesta região fazem da França um aliado bastante desejável aos olhos dos seus parceiros.

Como parte do esforço para proteger os interesses franceses, o presidente Emmanuel Macron tem procurado fortalecer relações e forjar alianças com outras potências influentes no Indo-Pacífico. Assim, em 2018, Macron visita Nova Deli, como forma de reforçar a sua aliança estratégica com a Índia, particularmente no domínio marítimo. Em 2019, Macron discute com o líder japonês realizar exercícios navais conjuntos de modo a contrariar as estratégias utilizadas pela China que, segundo estes, vão contra as leis do Direito internacional.

No entanto, para a França, a Austrália constitui-se como o seu maior parceiro e aliado. Aliás, as relações entre os dois Estados têm sido reforçadas ao longo dos últimos anos. No fundo, a França vê a Austrália como um país com objetivos similares àqueles procurados por Paris, e como um país capaz de assegurar a estabilidade da região. Em 2017, Paris e Canberra assinam uma Estratégia Conjunta de Parceria que visa promover uma cooperação, a longo prazo, no Indo-Pacífico.

Em 2018, na sua visita à Austrália, Macron, em matéria do Indo-Pacífico, invocou a necessidade de se estabelecer um eixo de cooperação Canberra-Deli-Paris. Ainda na mesma visita, Macron identifica três imperativos estratégicos essenciais para a sua posição no Indo-Pacífico: limitar os possíveis danos que a ascensão da China possa significar para a França, preservar a relação entre a França e os EUA, e colocar a França o mais longe possível da rivalidade Pequim-Washington.

Assim sendo, o principal objetivo para a França é proteger os seus interesses e a ordem internacional. No entanto, em termos mais gerais, verifica-se ainda, o desejo da França de enviar uma clara mensagem a Pequim em termos de segurança marítima. Posto isto, a França apoia ainda a entrada dos Estados da União Europeia na estratégia Indo-Pacífica, pois considera que estes seriam essenciais para assegurar a liberdade de navegação e ainda, apoiar as decisões francesas.

A verdade é que, a região do Indo-Pacífico, é um espaço imaginado. Sendo as estratégias nacionais de cada Estado que determinam a importância da zona. Aliás, as fronteiras desta “região” chegam a ser diferentemente determinadas pelos distintos atores, que levam em consideração apenas os seus interesses. O Ministro da Defesa francês considera que o Indo-Pacífico se estende desde o Djibouti até à Polinésia Francesa. O facto de cada Estado ter a sua própria definição para o Indo-Pacífico é sem dúvida um dos principais motivos pelos quais esta zona se torna tão importante estrategicamente e os diálogos em torno da mesma se complicam.


Fotografia por: Ludovic Marin.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Portugal e a extensão da ZEE, os novos descobrimentos ou o novo mapa cor-de-rosa? por Filipe Galvão

  Filipe Galvão analisa a  tentativa de expandir a Zona Económica Exclusiva (ZEE) por parte de Portugal e da sua diplomacia, como forma de aumentar a sua influência geopolítica através da via legal e da política externa, será aceite pela comunidade internacional? Até porque como afirmou outrora Napoleão “A política dos Estados está na sua geografia”.

A importância das relações de Portugal com os PALOP e com a CPLP no panorama internacional

FILIPA RIO MAIOR  aborda as relações de Portugal com os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e com a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e a importância que as mesmas tiveram (e ainda têm) no panorama internacional.     

O Antagonismo da Água: uma arma de guerra ou um instrumento para a paz? A importância da diplomacia

  TÂNIA MELRINHO  demonstra que as tensões e desacordos pelo acesso à água continuam a crescer a um ritmo célere, ao mesmo tempo que a escassez da água se mostra como uma ameaça, a diplomacia da água e a sua mediação passam a assumir um lugar primordial na política externa.