BÁRBARA SOFIA MALTEZ argumenta que a eleição de Joe Biden, para Presidente dos Estados Unidos da América, é uma mudança positiva para a agenda climática internacional, após o retrocesso que a Administração Trump provocou nesta matéria. A União Europeia tem um aliado à sua disposição.
A ascensão dos EUA a maior potência económica ocorre após a 1ª Guerra Mundial, com a fragilização do status quo do "velho continente" e com a utilização de combustíveis fósseis, maioritariamente importados. A acompanhar, assistimos a uma progressiva dependência relativamente a estas energias, pelo que, ainda hoje, o "sonho" norte-americano de independência e segurança energética está longe de se concretizar.
As ações externas das administrações norte-americanas têm-se pautado pela procura da manutenção da supremacia dos EUA no sistema internacional, promovendo os dogmas democráticos e liberais. Historicamente, isto revestiu-se de uma política intervencionista com uso do unilateralismo e do hard power ou, de uma postura cooperativa e multilateral, com recurso ao soft power. Assim, a sua política externa pode ser compreendida segundo as visões realista e liberal, embora a primeira prevaleça.
Sob o lema America First, a administração Trump apostou numa política unilateral e isolacionista, em detrimento da diplomacia e da cooperação, para além do negacionismo relativamente às Alterações Climáticas, que o levou a revogar políticas ambientais que garantiam a proteção de espécies animais e salvaguardavam zonas da exploração de recursos fósseis. No ano de 2017, Donald Trump, anunciou a saída dos EUA do Acordo de Paris, apesar de ocuparem o segundo lugar de maiores poluidores do mundo.
Com a vitória de Biden prevê-se uma mudança de paradigma, tanto a nível doméstico como internacional, o que torna esta análise atual e relevante. Sendo o combate às Alterações Climáticas um dos pilares da sua campanha, e dando cumprimento às suas promessas, já reintegrou os EUA no Acordo de Paris e nomeou uma equipa especializada para atuar nas matérias ambientais.
O Biden Plan, menos ambicioso que o Green New Deal, envolve um investimento de dois trilions de dólares, durante quatro anos, na área dos transportes, da energia e da construção civil, procurando alcançar a neutralidade carbónica até 2050. O cenário político parece favorável à aprovação do pacote legislativo, com a maioria democrata na Câmara dos Representantes e no Senado, o que seria impossível com o controlo republicano, já que, para além do Presidente, o Congresso pode aceitar ou rejeitar iniciativas presidenciais e decidir em matéria de financiamento da política externa. Por isso, é fundamental que consiga aprovar as suas medidas antes das midterm elections de 2022, onde o Partido Democrata pode perder assentos. No Supremo Tribunal, poderá enfrentar uma grande oposição com uma maioria republicana de seis para três.
Nos últimos anos deparámo-nos com a redefinição da ordem internacional, com novas potências em ascensão, como é o caso da China, que usou a fraca liderança de Trump para maximizar os seus interesses nas relações internacionais, inclusive com a União Europeia. Os EUA vêem a sua posição hegemónica a ser questionada pela China, que, apesar de ser louvável o compromisso desta em reduzir as suas emissões carbónicas, adota uma posição política, ideológica e económica divergente da dos Estados ocidentais, assim como uma atitude incoerente relativamente aos seus discursos.
Biden, ao afirmar que os EUA vão liderar a resposta mundial à crise climática, pode dar um novo ímpeto às relações transatlânticas. Os Estados são “pequenos demais” para combaterem a crise das Alterações Climáticas isoladamente, sendo, por isso, premente uma resposta conjunta, não só porque é um problema comum, mas porque as suas consequências são devastadoras. O restabelecimento das relações entre EUA e UE é vantajoso para os dois lados: a Europa é um espaço com valor geopolítico estratégico para os interesses norte-americanos na competição com a China; a UE pode usar a aliança transatlântica como alavanca de destaque na competição estre as duas esferas de influência.
O atual ambiente internacional, mas também doméstico, influencia a formulação da política externa, sendo que Biden precisa de se adaptar às imprevisibilidades que vão surgindo. Um possível retorno do Trumpismo, em 2024, significaria a reversão do trabalho que pretende ser realizado, em matéria ambiental, com Biden. Por outro lado, em quatro anos, será um trabalho hercúleo para que o atual Presidente consiga alterar todas as medidas revogadas pela Administração anterior. Depois do interregno de Trump, é vital que o trabalho anteriormente desenvolvido seja retomado e continuado num esforço conjunto.
O distanciamento ideológico que tem marcado os EUA nos últimos anos, e que culminou no ataque ao Capitólio, no dia 6 de janeiro, pode ditar que a Administração Biden esteja mais ocupada com a política doméstica do que com a externa. O cenário pós-covid pode proporcionar uma oportunidade de “recuperação verde”, que garanta uma transição económica justa.
Concluindo, os EUA e a UE partilham um conjunto de desafios, não só pela História que os liga, mas pela proximidade de ideias e crenças, o que os coloca como aliados óbvios, num mundo cada vez mais marcado pela desigualdade, pela crise, pelo crescimento do autoritarismo e de potências que contradizem os seus pilares fundacionais. Apenas, e só pela liderança através do exemplo e da cooperação internacional, a Humanidade conseguirá resolver um dos seus maiores desafios – as Alterações Climáticas. É preciso agir hoje, pois está em causa o nosso amanhã!
Fonte da imagem de capa: https://www.japantimes.co.jp/opinion/2020/12/11/commentary/japan-commentary/expectations-joe-bidens-administration-differ-country-country/
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