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A União Europeia unida contra a infodemia



   PATRÍCIA RODRIGUES defende que a situação pandémica não se trata somente de uma crise de saúde pública mas também de uma crise democrática e digital. A pandemia possibilitou a propagação da infodemia.

   A desinformação e as notícias falsas põem em causa a democracia, a capacidade de decisão informada dos cidadãos e, em tempos de pandemia, a saúde de todos. Antes de mais, torna-se relevante clarificar o conceito de infodemiaEste associa o excesso de informação sobre um determinado tema à rapidez e facilidade de divulgação por vários meios, nomeadamente pelas redes sociais. No início da pandemia, era possível identificar uma carência de informação relativa ao vírus, considerando o seu caráter recente, e o medo aliado à insuficiência de conhecimentos disponíveis contribuiu para a difusão de narrativas pouco verídicas ou enganadoras. A relação entre a pandemia e a infodemia pode ser entendida como uma relação simbiótica o que, simplificadamente, significa que se encontram numa constante dependência mútua, potencializando o crescimento e a consolidação de ambas.

     No  ano  de  2014, o  Fórum  Económico  Mundial  divulgou  um  parecer  sobre  a  agenda global e os principais desafios associados. Um dos  problemas  destacados incide  sobre a rápida propagação de notícias  falsas  como  uma das dez tendências  inerentes  às sociedades  modernas, o  que  traduz  a  evolução  gradual  positiva do uso  do  meio  digital  como  um  recurso  para  alcançar ambições e fins pouco  democráticos e, em alguns casos, pouco éticos.

    A Europa tem sido caracterizada como um campo de testes com a finalidade de controlar o fenómeno da desinformação nas democracias e sublinha a relevância deste combate perante a comunidade internacional, reiterando que a solução exige cooperação quer a nível interno, entre as diversas instituições domésticas de cada Estado, quer a nível externo. O combate à desinformação encontra-se, atualmente, no topo da lista de prioridades da agenda digital da União Europeia que pretende apresentar respostas assertivas face aos desafios da democracia digital por intermédio de novos mecanismos e atos legislativos. A Comissão Europeia, a instituição detentora do poder de iniciativa legislativa, reconhece que “a pandemia do coronavírus foi acompanhada por uma onda massiva de informações falsas ou enganosas, incluindo tentativa de atores estrageiros em influenciar os cidadãos europeus e os debates.” Assim, a Comissão apresentou a implementação do Plano de Ação para a Democracia Europeia e a Lei dos Serviços Digitais que, respetivamente, visam reforçar as democracias europeias e garantir um ambiente em linha seguro e responsável.

     A União Europeia pretende prosseguir os objetivos previamente definidos e, neste sentido, emprega diferentes estratégias de poder que podem assumir a denominação de soft power e hard power. Todavia, torna-se mais pertinente incidir sobre o soft power europeu aquando do contexto em causa. Este tipo de poder evidencia a capacidade de influência e, simultaneamente, a capacidade de persuasão, atração e cooptação de um determinado ator sobre terceiros. Através da ação da Comissão Europeia, plataformas de redes sociais como o Facebook, Twitter e Google implementaram, de forma deliberada, códigos de boas práticas que lhes atribuiu responsabilidade relacionada com a verificação do conteúdo partilhado. Para além disto, as plataformas com mais de 45 milhões de utilizadores europeus passam a ser obrigadas quer a implementar medidas de controlo dos respetivos riscos quer a adotar um novo quadro de responsabilização e de supervisão, permitindo uma intervenção mais direta da Comissão perante as mesmas. 

     Deste modo, as instituições europeias ampliam o seu soft power através do reforço das suas políticas externas, compreendidas como legítimas e possuidoras de autoridade moral,  em consonância com os seus valores políticos, reconhecidos quer a nível doméstico quer a nível externo, e da sua cultura, nos lugares onde é vista como atrativa para outros. Por conseguinte, a União Europeia deve continuar a desenhar uma política tangível e bem estruturada que garanta uma resposta eficaz no combate às ameaças do espaço digital, assente na comunicação estratégica moderna baseada em dados e na diplomacia pública, elementos considerados fundamentais. Nesta linha de pensamento, pode-se enfatizar a importância da ação diplomática europeia no que toca à apresentação da sua própria política externa e a afirmação da mesma perante a comunidade internacional, recorrendo a diversos instrumentos.

     Em boa verdade, as iniciativas implementadas pela União Europeia são extremamente úteis e eficazes, contudo o combate contra a desinformação somente será atenuado ou até mesmo vencido quando os utilizadores digitais conseguirem diferenciar as notícias verdadeiras das notícias falsas. Este fenómeno, embora não seja algo novo, foi impulsionado pelo surgimento da Internet, pelo processo da Globalização e pela primazia dos meios digitais em detrimento dos meios ditos clássicos. O direito à liberdade de expressão e de impressa deverão estar sempre presentes quando o debate se centra no combate à desinformação. 

Fonte do cartoon: UNESCO


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