MADALENA GONÇALVES considera que, após anos de fracasso em tentar coagir o Irão a mudar qualquer política a seu favor, é tempo de Washington repensar em como deverá empregar a sua influência estratégica com eficácia.
A retirada dos Estados Unidos,
na antiga presidência de Donald Trump, do acordo nuclear - Plano de Ação
Abrangente Conjunto, doravante JCPOA - negociado na antecedente Administração de
Obama, e derivado do alegado incumprimento da responsabilidade iraniana, o Irão e
os Estados Unidos, de futuro EUA, demonstram pretensão no restabelecimento do mesmo acordo
nuclear de 2015. Todavia, o continuo braço de ferro bilateral entre estes dois Estados, não
revela sinais de abrandamento.
Apesar das sanções impostas pelos EUA ao Irão, e da saída do próprio acordo, as mesmas não limitaram o comportamento de Teerão face ao seu programa nuclear. Embora, as mesmas tenham causado sérios desafios à economia iraniana no acesso a recursos financeiros, as sanções tiveram um impacto contrário, ainda que previsível na resposta do Irão, que culminou numa escalada de contra-ataques, reflexo do hard power destes dois Estados. No lugar de impactar negativamente a ação do Irão, estas sanções permitiram a intensificação da própria estratégia de construção de alavancagem no processo das suas atividades nucleares, no programa de mísseis e nas demais atividades desenvolvidas no âmbito regional levadas a cabo pelo Irão. Este reação “vingativa” por parte do mesmo, contribuiu não só, para o grande aumento da capacidade de desenvolvimento de armas nucleares, como também se revela percetível na mudança da retórica política de autoridades relevantes, no que diz respeito à possibilidade de trespassar esse limiar de segurança internacional.
O líder supremo do Irão, ayatollah Ali Khamenei,
que até então não tinha demonstrado abertura a negociações, manifestou a intenção
de regresso ao acordo nuclear, sob a condição dos EUA retirarem as
suas sanções, no entanto, a atual presidência de Joe Biden afirma que as sanções
serão mantidas e que o Irão é que terá de tomar essa iniciativa, cessando o
enriquecimento de urânio que ultrapassa os limites acordados em 2015. Esta postura, veemente condenada pelo regime
iraniano, levou à ameaça de que, se as sanções não forem levantadas até 21 de Fevereiro, Teerão, irá aumentar,
ainda mais, a sua capacidade de enriquecimento de urânio, o que colocará em
causa o fabrico de armas nucleares e potencializar a ameaça à segurança global, podendo mesmo optar pelo abandono das negociações que, à semelhança da Coreia do Norte, assumem uma posição de negação relativamente ao controlo da não proliferação nuclear, que só favorece a disseminação de armas nucleares, asseverando o poder iraniano.
Desta forma, qualquer pré-condição imposta, coloca obstáculos ao diálogo entre os dois Estados e dificulta o retorno ao JCPOA, todavia, as principais prioridades atuais da nova administração Norte-americana vão de encontro à imposição de limites ao programa nuclear, segundo soluções negociadas entre as partes. Contudo, é evidente a necessidade de Biden procurar um retorno limpo ao acordo, no sentido de concretizar a rutura com a política estratégica fracassada de Trump que só impulsionou a corrida nuclear iraniana. Assim sendo, exigindo condições desnecessárias adicionais ao Irão, coloca em causa a segurança internacional, não sendo mais do que uma continuação da politica de Trump, quando o mundo anseia por uma posição de rutura face à mesma.
Perante este impasse, e
resvalando agora para um plano de análise multilateral da conjuntura estratégica descrita, a
União Europeia ganha agora espaço e uma oportunidade para reavaliar a sua abordagem relativamente à parceria transatlântica, e deve procurar ocupar uma posição mediadora, incitada
pelo ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão, Javad Zarif, que convocou a mesma enquanto presidente da Comissão Conjunta do JCPOA, para monitorizar
a implementação do acordo e sincronizar as posições tomadas por ambos os
Estados. Assim, a União Europeia ocuparia não só, pela sua
autonomia estratégica, o centro da agenda nuclear, marcando a sua posição sobre o assunto, como
também investiria nas suas relações transatlânticas, das quais beneficiaria com
possíveis alianças e acordos diplomáticos a estes Estado. Contribuiria ainda, para o equilíbrio de poderes global ao utilizar, enquanto soft power, a
sua influência neste âmbito da segurança europeia e internacional.
Posto isto, os Estados Unidos devem procurar estabelecer um retorno ao
JCPOA pela via do consenso, no sentido de impedir o acelerado incremento do programa nuclear iraniano,
segundo uma abordagem propicia ao entendimento entre as partes envolvidas. Esta
possibilidade de consonância, não só permitiria aos Estados Unidos intensificar
a sua alavancagem nuclear, como também impedir mais avanços nucleares do
Irão, mitigando também a possibilidade de um conflito militar com o mesmo. Para
além disto, regressar ao acordo, poderá ainda significar o restauro de
esforços diplomáticos multilaterais com a União Europeia. De salientar que, apesar deste acordo, os Estados Unidos carecem de um plano estratégico de
combate às restantes atividades iranianas que ameaçam os interesses dos EUA e
dos seus aliados. Deste modo, o regresso ao mesmo permitiria aos EUA angariar tempo para acordos subsequentes
noutras áreas de contenção estratégica, relevantes para as suas questões de segurança
e dos seus aliados. Assim, é urgente que a União Europeia tome parte deste regresso
ao acordo, procurando a concordância
entre todas as partes, uma vez que é a segurança internacional que está no centro do debate, que se vê ameaçada pela acentuada proliferação nuclear à escala mundial.
Referências adicionais:
Walt, Stephen M. (1998). International Relations: One World, Many Theories. Foreign Policy, No. 110, Special Edition: Frontiers of Knowledge.
Fonte de Imagem: https://www.cartooningforpeace.org/en/editos/the-persian-spring/
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