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Chipre: um Palco de Guerra

   
    Margarida Marques analisa os conflitos no território cipriota partilhado entre a Grécia e a Turquia, que com a descoberta de depósitos de gás natural por explorar na região mediterrânea, voltaram a intensificar-se, sobrepondo os seus interesses aos dos cidadãos do Chipre. 

    O Chipre, um país Mediterrâneo, é o palco de um longo conflito entre a Turquia e a Grécia. Desde 1974, quando as forças armadas Turcas invadiram a ilha, que o território Cipriota está dividido, a Turquia tomou um terço a Norte da ilha, hoje dominado pelos Cipriotas Turcos, enquanto os restantes dois terços do Sul da ilha é dominado pelos Cipriotas Gregos, sendo a fronteira entre estes monitorizada por tropas da ONU. 

Figura 2 - Divisão do Chipre

    Mais recentemente, a tensão na ilha voltou a intensificar-se após a descoberta de depósitos de gás natural na região mediterrânea. Não só no Chipre, mas também em Israel e no Líbano, o que despontou o interesse e competição entre países para a exploração energética, pois não só os próprios países estão interessados, mas também outros, como a Turquia, Grécia, Irão, Estados Unidos da América (EUA), União Europeia (UE), Egito, Líbano e Rússia, sendo os últimos três os atores com uma maior influência na área por dominarem a exploração energética na área. Por isso, a concentração da exploração nos países onde o depósito se localiza poderia vir acalmar a competição e conflitos na zona, e diversificar os fornecedores energéticos da UE, ou no caso do Chipre deixando mesmo o fornecimento dentro da UE. 

    Tal poderia ser benéfico para o Chipre, se a ilha estivesse unificada. Mas devido aos locais onde se encontram os depósitos de gás natural, um no território de domínio Turco, e o segundo na zona económica exclusiva, sobre a qual o Norte e o Sul disputam o exercício de direitos, um consenso entre os países que dominam o território parece improvável, uma vez que o Governo Cipriota Turco tem afastado todas as ofertas de offshore e a marinha turca tem ameaçado os progressos da exploração energética no domínio Cipriota Grego.

    Para além dos próprios conflitos na ilha, o Chipre pode também ser intermediário entre conflitos preexistentes entre Israel e a Turquia, principalmente devido à intenção de Israel de exportar o gás que o próprio produz para a UE. Mas para tal, terá de usar um rota através do Chipre para chegar à Grécia. Assim, o Chipre poderia ter uma relação de cooperação com Israel, mas devido a conflitos prévios entre Israel e a Turquia, esta relação torna-se hostil e de potencial conflito pelo domínio da Turquia sobre o Chipre e a ameaça que representa para uma relação com o Governo Cipriota Grego. 

    A zona mediterrânea possui um grande potencial económico e energético, que acaba por ser terrivelmente prejudicado pelas relações de conflito e competição entre os países. O que prejudica todos os atores envolvidos, e no caso em análise, o Chipre, não é apenas a divisão da ilha, mas também os conflitos dos países que a dominam com países vizinhos, o que acaba por colocar a ilha num ponto estratégico tanto para os seus dominantes como para os seus inimigos. Sendo que, neste conflito, é o próprio povo Cipriano o prejudicado por, em caso de ataque estratégico, não tem capacidade para se defender sem a intervenção dos países que o dominam, no caso de um ataque externo. E o seu território é utilizado como “campo de batalha” para o conflito entre os dois países dominantes, mesmo que não seja física, acaba por ser uma batalha psicológica, de voltar o povo Cipriota contra si próprio (o lado Grego contra o lado Turco), económico, cultural e político.

    Todas estas ações poderiam ter um cariz racional, uma vez que os Estados atuam maioritariamente de acordo com os seus interesses, mas muitas das decisões dos principais Estados envolvidos neste conflito, devem-se e são influenciadas por circunstâncias e acontecimentos internos. Como nas eleições Turcas de 2019, nas quais se sentiu o ressurgimento e a afirmação de uma narrativa nacionalista que veio cessar a possibilidade de discussão internacional sobre um acordo Cipriano e retirada das tropas Turcas da ilha.

    Os países europeus não demonstram interesse em tomar partes no conflito mediterrâneo que tem vindo a prejudicar o Chipre. Contudo, a UE tem tentado desempenhar um papel mediador no constante conflito entre a Grécia e a Turquia, de modo a apaziguar os conflitos no mediterrâneo, especialmente para voltarem a tentar um consenso quanto à exploração, o que levou a novas reuniões entre os países.


Fonte de imagem 1 - https://www.cvce.eu/en/obj/cartoon_by_behrendt_on_the_cyprus_question-en-12eb398a-826b-445f-836e-8fb3b979134e.html

Fonte de imagem 2 - https://www.bbc.com/news/world-europe-17217956

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