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Como a Austrália arrisca a sua economia para ser uma colónia dos EUA

 The Global Times cartoon depicting Australia as a puppet of the US in its conflict with China. Source: Global Times

   LUÍS RODRIGUES defende que a relação próxima entre os Estados Unidos da América e a Austrália nos últimos tempos poderá criar um clima tenso entre o governo australiano e o chinês, sendo a China extremamente importante para a economia australiana.

As intenções americanas parecem claras face a esta situação e, dos três, a Austrália é quem mais tem a perder.  

    A realidade é que a Austrália nunca se importou com o tipo de regime do país ou questões propriamente políticas quando se tratava da sua economia e do seu crescimento, mas nos últimos tempos essa questão mudou, com uma aproximação clara entre o primeiro-ministro Morrison e a Administração Trump. Neste contexto, surge uma aliança entre os dois países, “aliança indestrutível”, com a Austrália a fazer uma série de ataques ao governo chinês. Mais, o antigo Secretário de Estado Mike Pompeo, numa viagem à Austrália disse mesmo: a parceria está fundamentada nos nossos valores compartilhados de democracia, Estado de Direito e direitos humanos” , reforçando a ideia de que a Austrália adotou uma posição agressiva face à China de modo a reforçar estes ideais contra um país antidemocrático. Atualmente, com a Administração Biden na Casa Branca, existem vários relatos de que a aliança com a Austrália se vai manter, mas com uma abordagem diferente da de Trump, com uma visão mais para fora e menos para dentro ao contrário da iniciativa trumpista do “let’s make America great again.  

    Ao longo dos últimos anos temos visto uma relação complicada entre a China e os Estados Unidos, com ataques das duas partes de modo a tentar impor a sua dominância. Por um lado, temos os Estados Unidos, uma democracia que, nas últimas décadas, tem sido a economia mais forte do Mundo e cujo o seu poder militar não fica atrás. Por outro lado, temos a China, um país autoritário que apresenta o maior crescimento económico da última década e que se arrisca, em poucos anos, a ultrapassar a maior economia do Mundo, os Estados Unidos. Os interesses das duas partes são vastos, tanto a nível económico, militar ou geopolítico. É, na sequência desta inimizade das duas maiores potências económicas atualmente que, entre outros, surgiram situações como a guerra comercial EUA-China. Se por um lado existe esta realidade, surge outro ator importante para o futuro desta relação, a Austrália.  

A Austrália é um país que, ao longo dos anos, não tomou qualquer tipo de posição face a este tipo de guerras e, se pensarmos, neste contexto fazia sentido que assim se mantivesse, pois, por um lado, tem a China que é o seu maior parceiro económico representando mais de um quarto das suas exportações e, por outro, tem os Estados Unidos que são o seu maior parceiro estratégico. 


    A relação entre a China e a Austrália piorou ainda mais quando o Governo australiano decidiu não só apoiar os EUA para um inquérito face às origens chinesas da Covid-19, mas ser o primeiro país a apresentar esta situação na Assembleia Mundial da Saúde em Genebra. Apesar da situação ter sido controlada pela União Europeia e, a China e a Austrália terem chegado a um acordo, o Governo chinês não hesitou em ripostar com uma imposição de tarifas às importações australianas, sancionando empresas e avisando os cidadãos para não viajarem para a Austrália. Esta sanção por parte da China representou um abalo extraordinário na economia australiana que, por cima disto, viu serem cancelados contratos da China no valor de 600 milhões de euros.   


    Posto isto, a reação australiana não demorou, tentando aproximar-se rapidamente da UE, o seu segundo maior parceiro económico, tentando acelerar as negociações para um Acordo de Comércio Livre Austrália-UE. É preciso acrescentar também, que a Austrália acusou indiretamente a China a 19 de junho de 2020 de ter sido o autor de um ataque informático de grande alcance 


    A principal questão nesta novela, é de que tanto a China como a Austrália dependem uma da outra. Enquanto a Austrália depende economicamente da China que representa mais de um quarto das suas exportações, também a China depende da Austrália, porque as exportações são de recursos naturais como o ferro, o carvão e o gás natural, que têm proporcionado uma larga taxa de crescimento da China, É de frisar ainda, que tanto a educação como o turismo australiano, as principais exportações de serviços do país, são dominados pela China. Posto isto, é fácil de perceber que existe uma grande dependência entre as nações e que seria muito difícil contrariar esta lógica de “entreajuda” entre os dois países.   


    No meio deste “imbróglio” resta uma pergunta, quais são as intenções dos Estados Unidos para com a Austrália no meio disto tudo? Eis que a resposta é muito simples, a China representa uma ameaça clara para os EUA, tanto a nível económico, político, ideológico como militar. É no seguimento desta ameaça, que os Estados Unidos precisam de uma estratégia geopolítica forte de modo a manter os seus interesses assegurados. Já depois dos avanços do ex Presidente Trump, começou uma campanha de aliados de Washington com a Administração Biden, sendo alguns dos aliados principais e mais importantes a Austrália e o Japão que, entre outros, assinaram um pacto de defesa que permite às suas forças militares treinar nos solos um do outro, ou seja, estes dois aliados dos EUA criaram uma aliança militar que permite aos EUA não só refortalecer as relações entre os dois países, mas também ter dois aliados poderosos perto da China, criando uma estratégia geopolítica importantíssima para o país. Os EUA reforçaram ainda a cooperação militar com Índia, que se apresenta como outro ativo importante na estratégia geopolítica americana.   


    Em suma, a questão entre os três países ainda tem muito para contar. Por um lado, vemos os Estados Unidos a aproveitarem uma viragem no que toca à política externa da Austrália para reforçar as suas estratégias e valores anti-China e, por outro, vemos uma China que não pretende largar os EUA da mão e ultrapassá-los economicamente tornando-se na maior economia do Mundo. A Austrália tem, neste momento, tem “a faca e o queijo na mão”, mas uma coisa parece ser certa, qualquer que seja o rumo que tomar, não só irá deixar uma das potências como sua possível inimiga como pode gerar um abalo na sua economia e na sua política externa. Há muito que a Austrália tem andado numa linha ténue entre os seus interesses económicos nacionais e os seus interesses estratégicos, isto, pode representar um futuro económico frágil da Austrália em prol de uma aliança estratégica com os EUA. 



fonte de imagem: Global Times

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