MARTA PEREIRA escreve sobre o problema da crise dos refugiados associando ao detrimento do Estado de Direito na União Europeia.
Desde
2011 que a Europa conhece uma das maiores crises humanitárias, a crise de refugiados. Estes refugiados encontram-se em fuga numa
situação de desespero, procurando auxílio e apoios em países terceiros. É neste
momento que os países da União Europeia entram na equação, devido a serem
excelentes agentes para o auxílio destes refugiados. A Síria, Iraque e Sudão do Sul são os principais países de origem dos refugiados que chegam à União Europeia.
Neste
contexto de fluxo migratório crescente, devido à chegada de mais refugiados às portas
da União Europeia, foi criado o CEAS (Common European Asylum System). Ao abrigo
desta lei, todos os Estados-membros da União Europeia devem agir segundo as diretrizes
apresentadas pelo Tribunal de Justiça da União Europeia e, que se encontram também
presentes na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. O princípio geral
do CEAS é garantia de que todos os refugiados, que chegam às portas da União,
têm o direito de receber auxílio e abrigo. Sendo assim, proibido reenviar
refugiados para o seu país de origem, principalmente caso estes corram risco de
perseguição devido à sua raça, religião ou opinião política.
Todas as pessoas que passam por este sistema, passam a ser abrangidas pelos
mesmos direitos e deveres que um cidadão originário do país em questão. A
própria CEAS consagra o direito à saúde, educação, emprego, entre outras
condições de vida básicas.
Cada
Estado-membro tem as suas quotas estabelecidas para o número de refugiados que pode,
e deve, receber anualmente. No entanto, grande parte dos países da União
Europeia continuam a mostrar-se muito resistentes ao acolhimento de refugiados,
como é o caso da República Checa, Hungria, Polónia e até Portugal que apenas recebeu
49% da quota que lhe foi atribuída, durante o ano de 2017.
Para
além do desrespeito aos Direitos Humanos, para a União Europeia isto é um claro
sinal de enfraquecimento da rule of law, um dos princípios que deu forma às
democracias após Segunda Guerra Mundial e, que acabaram por se tornar os
pilares de funcionamento da União. A rule of law, segundo a UE, é definida como
o princípio que defende que nenhuma pessoa, instituição ou entidade está acima
da própria lei.
Conclui-se então que o respeito pelos Direitos Humanos, e pelos próprios valores
da União, devem ter um papel de primazia na estruturação da política interna e
externa de todos os Estados-membros.
O cumprimento das quotas atribuídas a cada Estado-membro traduz-se num fortalecimento
da rule of law e da identidade da União Europeia. Cabe à União fazer uma
utilização mais eficaz da sua influência e poder sobre os Estados, de forma a
cumprir as quotas de refugiados que lhe são atribuídas.
Numa
perspetiva teórica, podemos olhar para esta situação utilizando a problemática agente-estrutura.
Nesta teoria, embora existam várias abordagens, é discutido o peso relativo de
cada dimensão, a doméstica e internacional, e o seu papel na formação da
política externa de cada Estado-membro ou até da estrutura. A abordagem que
melhor enquadra nesta problemática é a estruturalista, que defende que a
estrutura (União Europeia) em que cada agente (Estado-membro) se enquadra, deve
ter um papel de relevo na construção da política externa de cada Estado-membro,
através do fornecimento de diretrizes e inputs sobre um determinado assunto.
Neste caso em concreto, o fornecimento de diretrizes da União Europeia, ou
seja, uma contribuição da dimensão internacional, iria ter uma tradução
significativa na estruturação da política externa. Contudo, essa mesma tradução
e o seu impacto, iria depender diretamente do tipo de influência que a
estrutura tem na agência. Caso a União Europeia não tenha a capacidade de
influenciar ou alterar o comportamento dos outros agente, conclui-se que o
poder que lhe é atribuído não é forte o suficiente.
Cas
Mudde, no fim de 2019, já apontava para a emergência e insistência na questão de imigração e integração de refugiados,
de forma a que os países da União Europeia se tornem em espaços onde sejam
garantidas todas as necessidades básicas para uma vida com qualidade,
nomeadamente o saneamento, alojamento, saúde, educação e alimentação. Atualmente,
e com a devastadora pandemia que se enfrenta, ainda questionamos a atuação e
gestão da União Europeia em relação aos refugiados. A sua atuação deveria ter
como objetivo a defesa dos Direitos Humanos e da sua própria rule of law, cuja
importância tem vindo a ser ignorada por grande parte dos Estados-Membros, tal
como têm ignorado as quotas de refugiados a receber.
No cerne da questão, apenas são pedidas as condições básicas para que um refugiado possa ter uma vida com qualidade e paz, sem perseguições e guerras, obedecendo à Declaração dos Direitos Humanos.
Fonte do cartoon - António Jorge Gonçalves
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