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Hollywood a arma silenciosa

 


DANIELA SANTOS apresenta o Cinema como uma arma que encanta o nosso imaginário, mas que tem a capacidade de manipular as relações no sistema internacional

    Hollywood, a fabrica dos sonhos e ilusões projetadas no ecrã e na política externa norte-americana torna, assim, o cinema numa arma de propagação da hegemonia cultural do “american way of life e do imperialismo americano atuando como guardião da democracia. Desta forma, os filmes eram dirigidos para as massas e começam a ser produzidos os famosos blockbusters, ou seja, as grandes produções dedicadas ao entretenimento e ao merchandising que expõem os compromissos políticos e ideológicos dos EUA.  Esta grande influência acaba por “americanizar” o modo de vida à escala mundial definindo “o que é bom ou mau, positivo ou negativo, moral ou imoral.

    O cinema norte-americano é considerado como uma das primeiras formas de globalização, porém reflete uma paranóia dos EUA: ser a potência que salva o sistema internacional dos seus inimigos.  Estes inimigos acabam por ser estereotipados pela visão que os EUA têm e a exportam para o mundo. Assim, tem em posse uma arma de controlo de opinião que facilita o caminho para legitimar a sua política externa. Posto isto a cinematografia, na conceção de Joseph Nye, reflete a capacidade que um Estado tem de utilizar o seu soft power, ou seja, o seu poder de influenciar e atingir os interesses sem recorrer à coação/violência:

            A «sedução» dos valores da liberdade, dos direitos humanos, e das oportunidades individuais, diz, «é sempre mais eficaz do que a coação»

    Esta sedução cinematográfica inicia-se nos anos 30 com a política da Boa Vizinhança que tinha como alvo os países da América do Sul. Esta pretendia reverter a visão que os países latinos tinham dos EUA e o seu constante isolamento económico tendo como objetivo uma aproximação ideológica e cultural. Este soft power americano intensifica-se com a criação do “Office of the Coordinator of Inter-American Affairs (OCIAA)” que se dedicava à difusão dos objetivos americanos. A américa latina começa a ser inundada com filmes que difundiam o estilo de vida americano e retratavam os EUA como o “irmão mais velho protetor e salvador.

    Obviamente, que esta produção de filmes se precavia para não criar preconceitos relativos à cultura latina e os próprios latinos. Para o sucesso desta política foi essencial a criação de personagens que representassem o ideal latino, como o Zé Carioca. Tal como, a produção de filmes que enaltecessem esses países. Esta hegemonia cultural, torna- se mundial a par da 2ª Guerra Mundial consolidando o seu Império cinematográfico.

    A guerra mundial começou a ser retratada no cinema e este serviu como arma de propaganda norte-americana. Foi um período de cunhar a imagem norte-americana como o único país capaz de derrotar o nazismo e salvar a democracia. Foi, também, nesta altura que os EUA começam a representar os seus inimigos: os alemães associados ao nazismo e os japoneses devido aos ataques a Pearl Harbor, que até aos dias hoje são retratados como o inimigo e, muitas vezes, através da xenofobia.

    Esta hegemonia que assentou na construção das imagens dos “inimigos” e nas representações da guerra, ficou representada no Plano de Marshall que investia na distribuição dos filmes hollywoodianos na Europa. Com o fim da guerra, inicia-se o período da Guerra Fria que oponha os EUA à URSS numa guerra ideológica. Isto porque, os EUA tinham como pretensão internacional conter a expansão do comunismo. Desta forma, o inimigo passou a ser a figura comunista e os filmes vinculavam pela propaganda anticomunista minando o sistema internacional que o cidadão russo era um mal para a democracia.

    A produção norte-americana cimenta o seu imperialismo cultural e ideológico, principalmente, com o fim da Guerra Fria tornando-se a maior potencia mundial que comanda os mercados cinematográficos. Assim, a partir dos anos 90 o leque de inimigos dos EUA representados no cinema aumenta, porém com o início da política de combate ao terrorismo o Médio Oriente é alvo de Hollywood. Por isso, os Estados que não alinhavam com este combate transformava-se no “eixo-do-mal”  quer seja na conceção do sistema internacional ou em filmes.

    A política cinematográfica, assim, pode considerar que reflete o Destino Manifesto, ou seja, a crença que os cidadãos dos EUA tinham sido eleitos para liderar o sistema mundial. Portanto, tem como objetivo apresentar-se como um Estado puro e inocente que combate os inimigos, ou seja, qualquer ator que não alinhe nas suas políticas. Esta ideia está na base do excecionalíssimo norte-americano que legitima supremacia dos EUA através da construção do medo. Por isso, Hollywood tem esse papel importante de projetar este medo e desejos ligados à política externa norte-americana.

    Desta forma, cria estereótipos de povos e culturas representados nos filmes desde a nossa infância até a idade adulta. Esta realidade construída em prol da persecução de objetivos e interesses solidifica-se no “imaginário do expectador”. A desumanização das culturas acaba por dar uma identidade errada de um certo povo, por exemplo, a conceção que existe que os povos latinos são machistas ou as mulheres latinas são objetificadas sexualmente ou a não diferenciação dos povos asiáticos. Hollywood continua, assim, a perpetuar problemas sociais e divisões sociais que em muito representam os desejos norte-americanos para conseguir fazer do mundo seu.

Fonte, imagem: https://www.pinterest.pt/pin/545850417340929680/

 


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