Avançar para o conteúdo principal

Igualdade de Género: O ODS da ONU que ainda passa despercebido.

 



         RAFAELA MONTEIRO destaca a luta pela conquista daquele que é um direito humano fundamental, a igualdade de gênero,  como um dos maiores desafios para Organização das Nações Unidas. Porém, será toda a dedicação da ONU suficiente para impactar os Estados que a compõem?

Os Estados-Membros da Organização das Nações Unidas (ONU) olham, atualmente, para o futuro com base na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas fundamentada em 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)- desenvolvimento sustentável passa por satisfazer as necessidades das gerações atuais sem comprometer as gerações futuras. Ao longo do processo de introdução do conceito de desenvolvimento sustentável, a questão da desigualdade de género foi fortemente inserida na agenda dos Estados a partir do 5º ODS que visa o alcance da Igualde de género e do empoderamento da Mulher. Na sua essência, a Agenda 2030 apela à cooperação internacional e reforça a ideia de que os países não se conseguem desenvolver isoladamente e que é fundamental uma cooperação internacional que busque o progresso sustentável e a defesa dos direitos humanos. Aqui é dada extrema importância à organização internacional na criação de regulações e padrões que favoreçam a interação entre os múltiplos atores internacionais. Esta ideia vem dar apoio à Teoria Liberal aplicada à Política Externa, a mesma que esteve na génese da Organização das Nações Unidas e que, no caso em questão, explica o papel da ONU como intermediador dos países que cooperam entre si de forma a alcançarem plenamente o 5º ODS assim como, a vinculação deste aos restantes Objetivos.

Todavia, é necessário entender que os direitos das mulheres nem sempre estiveram no foco da agenda internacional e mesmo a própria mulher, durante muito tempo, não tinha um papel ativo nas relações internacionais, uma esfera que era vista tipicamente masculina. A luta histórica das mulheres e os movimentos feministas foram a razão pelos quais começaram a surgir instrumentos internacionais para tratar especificamente sobre o tema. Desta forma, os direitos das mulheres, assim como uma notável presença destas no domínio da politica, apenas começaram a ser vistos em conta na formulação de políticas públicas, desde o final dos anos 70, apoiados por instituições internacionais. Em 18 de dezembro de 1979 a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres foi adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas. Entrou em vigor como tratado internacional a 3 de dezembro de 1981 e, no décimo aniversário da Convenção em 1989, cerca de cem nações concordaram em se comprometer com as medidas. Por conseguinte, o cuidado pela temática da igualdade de género persistiu em todo o mundo e as tentativas dos países em encontrar uma solução a esta problemática mantiveram-se sob o controlo da ONU.

    Todavia, o esforço para cumprir o 5º ODS ainda é volúvel na realidade interna dos Estados-Membros da Organização das Nações Unidas. Estes estão ainda muito longe de alcançar a plena igualdade entre os géneros, existindo uma grande defasagem entre os enunciados nas Convenções internacionais e a conquista dos direitos das mulheres nos âmbitos nacionais. De acordo com o “Índice de Género” — o primeiro estudo que mede o progresso em relação a este conjunto de metas acordadas internacionalmente— nenhum país está irá alcançar a igualdade de género até ao prazo acordado (2030). O índice mediu o progresso de 129 países, classificando-os de zero a 100, sendo que a nota 100 significaria que o objetivo já teria sido conseguido. Apenas 21 países obtiveram uma pontuação acima de 80 enquanto, no lado oposto da tabela, foram também 21 os que ficaram abaixo dos 50 - Congo (44,0), República Democrática do Congo (38,2) e Chade (33,4). Um dado relevante e preocupante deste estudo é que mais de metade dos países tiveram uma pontuação baixa no que diz respeito aos esforços para alcançar o 5ºODS. A verdade, é que já seria de esperar que a Agenda 2030 não fosse implementada com a mesma eficácia em todos os Estados-Membros, face às peculiaridades inerentes a cada um. Assim, acabam por ficar destinados ao fracasso os Estados frágeis, onde a violência sexual, a falta de representatividade e participação das mulheres e a ineficaz punição aos perpetradores da violência de género são problemas cotidianos intrínsecos. Porém, mesmo em sociedades pacíficas e desenvolvidas, muitas mulheres estão em perigo de morte dentro das suas próprias casas. A meu ver, os Planos de Ação de cada Estado, encontrariam resultados mais positivos se ao invés de adotarem uma perspetiva feminista inclusiva, adotassem uma transformativa. Ou seja, para que as estratégias domésticas obtenham mais sucesso na igualdade de gênero, é necessária uma abordagem que atinja não apenas a violência direta como também a estrutural.

    Assim, apesar de se esperar que os planos de ação de cada Estado estejam em concordância com a Agenda internacional, isto é, tenham uma perspetiva liberal do feminismo, é fundamental que a ONU adote um papel mais prepotente, impondo sanções, de maneira a incentivar os países a mudar a sua postura em relação aos Direitos Humanos. Contudo, é importante salientar que apesar da importância das vias institucionalizadas existentes no sistema internacional, como as organizações internacionais e o próprio direito internacional, sozinhos não são suficientes para gerar mudanças localizadas na vida das mulheres. Posto isto, o 5ºODS expresso na Agenda 2030, uma Agenda internacional, implica que os Estados garantam internamente a efetivação dos direitos das mulheres internacionalmente anunciados.

 

 

                            

Comentários

Mensagens populares deste blogue

A importância das relações de Portugal com os PALOP e com a CPLP no panorama internacional

FILIPA RIO MAIOR  aborda as relações de Portugal com os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e com a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e a importância que as mesmas tiveram (e ainda têm) no panorama internacional.     

Portugal e a extensão da ZEE, os novos descobrimentos ou o novo mapa cor-de-rosa? por Filipe Galvão

  Filipe Galvão analisa a  tentativa de expandir a Zona Económica Exclusiva (ZEE) por parte de Portugal e da sua diplomacia, como forma de aumentar a sua influência geopolítica através da via legal e da política externa, será aceite pela comunidade internacional? Até porque como afirmou outrora Napoleão “A política dos Estados está na sua geografia”.

Apresentação

       Tabuleiro de Xadrez é um blogue sobre política externa, desenvolvido pelos alunos do 3º ano da licenciatura em Ciência Política do ISCSP, no âmbito da Unidade Curricular Laboratório II – Análise de Política Externa, sob responsabilidade da docente Andreia Soares e Castro.