GABRIELA TEIXEIRA considera que Joe Biden terá uma atitude perante Xi Jinping completamente diferente da de Trump. O novo presidente deverá assentar a sua linha de ação na cooperação com a China na resolução de problemas comuns.
O 46º Presidente norte-americano Joe Biden tomou posse no passado dia 20 de janeiro de 2021, mas as especulações em relação ao seu mandato vão aumentando a cada passo que dá. Será igual a Trump? Será mais diplomático? Será igual a Obama? Ou será apenas Biden? Neste oscilar de hipóteses, uma dúvida permanece: qual a futura relação entre o Presidente norte-americano Joe Biden e Xi Jinping, chefe de Estado da República Popular da China.
De um aspeto podemos estar seguros: a China e os Estados Unidos da América (doravante EUA) vão continuar rivais, mas o que muda agora é a atitude do novo presidente. Biden, ao contrário de Trump, quer jogar pelas regras do jogo internacional e evitar quaisquer tipos de conflitos. Este, apesar de considerar que a China é e vai continuar a ser o principal adversário internacional dos EUA, afirma que esta rivalidade se irá traduzir apenas numa “concorrência extrema”, e que irá seguir sempre uma abordagem diplomática. A administração de Biden, ao contrário da administração do seu antecessor, encontra-se predisposta a cooperar diretamente com Xi Jinping em questões como as mudanças climáticas e a saúde pública.
No que diz respeito à guerra comercial entre estas duas potências - iniciada por Trump em 2017 - o foco da administração de Biden deverá passar por pressionar o governo chinês a abrir a sua economia de maneira a não exercer tanto controlo estatal na mesma. Tal pode ser possível se as três grandes democracias desenvolvidas (EUA, Japão e União Europeia) unirem forças estabilizando a sua aliança, e mostrarem uma frente unida perante a China, uma vez que a junção de riqueza deste triângulo internacional excede a riqueza e o poder chinês.
Jen Psakim, porta-voz da Casa Branca, alegou que «O presidente está comprometido em impedir os abusos económicos da China», ou seja, mais uma vez Biden dá um passo em frente na diplomacia internacional, mas até que ponto é que este está disposto a ir para travar estes abusos? Certamente que num futuro próximo saberemos uma resposta concreta, porém, por agora, apenas podemos concluir que Biden está disposto a lutar não só pelo bem-estar americano, como também pelo bem-estar chinês (ou pelo menos, pelo bem-estar económico chinês que influencie o bem-estar económico americano).
Outro grande conflito deixado por Trump a Biden, é a guerra digital entre os EUA e a China, começada também no ano de 2017, que envolve sanções dos EUA contra empresas tecnológicas chinesas, como a SMIX e a Xiaomi. Apesar desta guerra ainda não ter um desfecho, Biden pode chegar a um consenso e unir forças com a China encontrando um ponto em comum que ambas as potências querem resolver: a regulamentação da Big Tech. Isto é, a junção de forças destas duas superpotências tecnológicas com a criação de um regulamento internacional sobre a economia digital, pode ser o ponto de partida de entendimento entre estes dois países, levando Biden a suspender todas as políticas que Trump aplicou sobre a tecnologia chinesa.
O foco de Biden na sua relação com Xi Jinping deverá passar por uma «competição estratégica administrada», de modo a que este não cometa os mesmos erros do seu antecessor, e entre em conflito aberto com o governo chinês. Este tipo de competição traduz-se num «estabelecimento de certos limites rígidos nas políticas e conduta de segurança de cada país, permitindo uma competição plena e aberta no domínio diplomático, econômico e ideológico». O segredo passará por uma abordagem multilateral de maneira a transparecer ao governo chinês que Washington não está “sozinho” no panorama internacional, e que Biden cada vez mais tem apoio de potências desenvolvidas (como a União Europeia, a Austrália e o Japão), que juntas conseguem travar as ambições do governo chinês e instaurar de novo a ordem internacional, seja através de políticas de regulamentação comuns, ou através de acordos bilaterais sobre os subsídios das exportações/importações internacionais. Assim, caso Xi Jinping esteja disposto a esta cooperação internacional, uma das consequências pode resultar numa abertura dos restantes países na realização de novos acordos com Pequim de forma a baixar as taxas alfandegárias chinesas, permitindo uma maior circulação de bens e serviços chineses no mundo ocidental.
Nesto contexto de sucessão, a relação entre EUA e China pode ser vista à luz de duas teorias:
• Se olharmos para o mandato de Trump, a relação que este estabeleceu com Xi Jinping apresenta características da Teoria Realista (Walt, 1998, p.31). Trump apresentou claras evidências de ceticismo no que toca à cooperação internacional, partindo sempre para o conflito (não necessariamente guerra armada) em vez de ponderar um acordo escrito. Estas ações demonstram uma atitude competitiva que veio reforçar a tensão entre as duas potências.
• Porém, tudo muda com Biden. Este Presidente é a antítese do anterior e, em apenas poucos dias de mandato, as suas intenções com a China já são visíveis -apresentando assim claros sinais da Teoria Liberal. Olhando para uma terceira e mais recente linha de pensamento desta teoria, a cooperação internacional é a chave para a paz entre as grandes potências e apenas organizações internacionais podem controlar estes fluxos de comportamento, impedindo: a sobreposição de poder de um Estado sobre os restantes, e uma instabilidade na ordem internacional (Walt, 1998, p.32). Biden, têm todos os recursos para voltar a colocar os EUA nas instituições internacionais, que outrora o cessante presidente retirou o país, assumindo uma linha de cooperação internacional, colocando assim o seu país de novo nos eixos da diplomacia.
Em suma, podemos concluir que o trabalho de Biden no que diz respeito à sua relação com Xi Jinping, seguirá uma estratégia internacional de longo prazo na escolha minuciosa das batalhas que decide combater e naquelas que deixa em suspenso. O ponto de partida deverá ser encontrar temas em que estas duas potências se podem unir (como a cooperação no campo da saúde pública) e deixar para segundo plano as divergências que outrora as separaram. Antes das regras da ordem internacional estarem estabelecidas é crucial encontrar um equilíbrio de poder entre a China e os EUA. Sabemos que ambos os países podem nunca vir a ter a melhor das relações, mas o clima de guerra aberta é evitável. De algo o governo chinês pode estar descansado: Biden irá expor a sua posição política através de declarações oficiais e não através de tweets.
Referencias adicionais:
Walt, Stephen M. (1998). International Relations: One World, Many Theories. Foreign Policy, No. 110, Special Edition: Frontiers of Knowledge.
Fonte da imagem de capa: Gabriel Campanario / The Seattle Times
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