Avançar para o conteúdo principal

IÉMEN: VÍTIMA DA POLÍTICA EXTERNA AMERICANA

 


Kyara Barros aponta que com a eleição de Joe Biden em 2021,  espera-se o fim  da guerra no Iémen e a restauração da paz no Médio Oriente. 

Os Estados Unidos da América conseguem administrar a paz e a guerra à volta do mundo. Quando a paz está a seu favor eles servem de mediadores e providenciam discursos para provar o seu envolvimento na manutenção da paz mundial. Mas, quando a guerra favorece a sua luta e conquista pelo poder eles recorrem a todos os meios necessários para esse fim. Providenciam armas, manipulam informações e controlam as marionetas que são as outras nações que se rendem a sua política externa, e posteriormente enfrentam as consequências, ou então são simplesmente apanhados no fogo cruzado como foi o caso do Iémen, que se tornou a maior vítima da política externa Americana no contexto da aliança de 75 anos entre a Arábia Saudita e os Estados Unidos.  As duas nações tinham o acordo dossauditas fornecerem petróleo aos americanos, e os americanos venderem armas aossauditas, e outros aliados no Médio Oriente. Para os americanos, a venda de armas aos sauditas era uma vantagem e um impedimento aos soviéticos de entrarem no Oriente Médio (Vox, 2018).

Esse acordo de vendas seria a origem de algo muito maior, que representou um claro erro de cálculo da política externa americana, quando a  Arábia Saudita altamente armada com armas americanas faz uma intervenção à guerra civil no Iémen em 2015, com um discurso de restauração do governo, mas o que resulta dessa intervenção é o agravamento do conflito, juntamente com a intervenção do Irão para apoiar os rebeldes. Essas intervenções dos Estados Unidos, Arábia Saudita e Irão enquanto atores estatais transforma o Iémen numa guerra por procuração, com ataques agressivos dos Sauditas, apresentando a pior crise humanitária ao resto do mundo. Verdadeiros crimes de guerra.

As  vendas de armas não cessaram com a administração Obama, muito pelo contrário, com a administração Obama foi aprovada a maioria das vendas das armas aos Sauditas na história dos Estados Unidos. Entre as vendas aprovadas estava a bomba que atingiu o autocarro escolar no Lémen em 2018. Por essa altura Presidente Barack Obama ao entregar a «caixa de pandora» com os fantasmas da política externa americana à administração Trump o problema de estabelecer a paz no Oriente Médio agravou-se, pois agora estava nas mãos do Presidente Donald Trump remediar essa situação, algo que ele já havia declarado não ter interesse, pois o seu foco eram os benefícios económicos da venda de armas (Vox, 2018).

O fato é que independentemente do seu trabalho, a administração terá de ser firme com a decisão de retirar os Estados Unidos da maioria das atividades relacionadas com a guerra em relação à Arábia Saudita. Acabar com a guerra pode ir além da influência da nova administração, mas acabar com a cumplicidade do Estados Unidos na guerra não é, e muito menos é acabar com a destruição do Iémen. Percecionando a situação os EUA têm em mãos uma lista enorme ações diplomáticas a fazer em relação ao Oriente Médio, o que não é nada mais que o mínimo, dado que são eles os patrocinadores deste cenário catastrófico. Biden poderia começar por reverter a decisão de última hora da administração Trump de designar os Houthis como uma organização terrorista. Depois poderia anunciar o corte da ajuda militar dos EUA ao esforço de guerra Saudita, e estipularia que as relações bilaterais dependeriam maioritariamente da forma como os Sauditas contribuem para encontrar uma solução prática de pôr fim à guerra.

 Embora a restauração da paz no Iémen seja oponto crucial na lista de coisas para fazer no Médio Oriente que os EUA têm, nada garante que o esforço seja bem sucedido, mas a equipa de Biden tem a grande vantagem de saber onde os seus antecessores erraram ao tentar isso, de ver o que não funcionou durante a administração Obama, e pode preparar um abordagem mais contida sobre as circunstâncias em que está disposto a prestar assistência. Pois, por mais que os Sauditas cooperem no processo de paz, após tanto tempo, pode revelar-se insuficiente. Os obstáculos à paz são numerosos e a guerra agora se desenrola em múltiplas frentes, cada uma com a sua própria dinâmica política e linhas de comando e controlo, e sem a entrada de todos os intervenientes é pouco provável que um acordo de paz se sustente (Robert Malley, 2021).

O cenário de destruiçãoirreversível no Iémen deve servir para recordar os custos de entrada de taisconflitos, e responsabilizar os envolvidos pelos crimes de guerra. Não apagar a história, mas sim aprender com ela, e isso cabe à administração Biden que tem a hipótese de diminuir a intensidade do compromisso com a Arábia Saudita, num esforço para reduzir o risco de consequências prejudiciais, mesmo que isso signifique reduzir uma ligação anciã crucial para proteger os interesses energéticos e de segurança dos Estado Unidos no Golfo. A administração ao elaborar o equilíbrio dos riscos, deverá rever as garantias de segurança dos EUA, para proporcionar mais espaço de manobra em situações como no Iémen, que embora graves, ficam muito aquém de uma ameaça existencial (Robert Malley, 2021).

O envolvimento dos Estados Unidos na guerra é marcado por parcerias envolventes, ambições e ações por conveniência. O desastre no Iémen é uma clara denúncia das falhas da política externa dos Estados Unidos, e evidencia que a dita política externa necessita de ser reavaliada. Cabe a Biden aprender com os erros dos seus antecessores e mudar o curso da história. A maior questão é saber se a Administração Biden realmente fará isso, ou se as promessas feitas seriam apena uma ilusão de um futuro melhor para o Médio Oriente e principalmente para o Iémen, a maior vítima do desastre.


Fonte imagem: Mohamed al-Sayaghi, Reuters Media Express.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

A importância das relações de Portugal com os PALOP e com a CPLP no panorama internacional

FILIPA RIO MAIOR  aborda as relações de Portugal com os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e com a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e a importância que as mesmas tiveram (e ainda têm) no panorama internacional.     

Portugal e a extensão da ZEE, os novos descobrimentos ou o novo mapa cor-de-rosa? por Filipe Galvão

  Filipe Galvão analisa a  tentativa de expandir a Zona Económica Exclusiva (ZEE) por parte de Portugal e da sua diplomacia, como forma de aumentar a sua influência geopolítica através da via legal e da política externa, será aceite pela comunidade internacional? Até porque como afirmou outrora Napoleão “A política dos Estados está na sua geografia”.

Apresentação

       Tabuleiro de Xadrez é um blogue sobre política externa, desenvolvido pelos alunos do 3º ano da licenciatura em Ciência Política do ISCSP, no âmbito da Unidade Curricular Laboratório II – Análise de Política Externa, sob responsabilidade da docente Andreia Soares e Castro.