JOÃO SILVA aprecia o mais recente acordo entre a União Europeia e o Japão, para além das mudanças escritas em suas longas páginas, como este representa um novo horizonte, e uma mensagem forte para um futuro que se revela instável e severo.
A história conjunta das relações entre o Japão e da União Europeia começa a construir-se no, pós 2ª Guerra, após a gênese dos seus sistemas políticos contemporâneos e de seus princípios que os moldam e que constituem uma importante página da história real num mundo em constante evolução.
Podemos começar retratando que tal história começa com um
dos estados basilares da própria união, a bélgica, com a sua anciã importância,
funcional e geográfica, para os valores e objetivos da União. Esta foi o
primeiro representante das então comunidades europeias, estabelecendo o
primeiro contato no ano de 1959. Não
obstante, a primeira delegação europeia só datará do ano de 1974,
estabelecendo-se em Tóquio.
Nos anos seguintes as relações intensificam-se, principalmente
em temáticas de cooperação económica, em que as mudanças de carácter político e
económico, até mesmo militar, do velho continente eram tópico de particular atenção
no país do sol nascente devido ao impacto imediato que suscitavam nas políticas
de restruturação do país e na condução da própria política externa.
O painel económico revelou-se como o ponto de convergência
basilar, sendo este central nas relações atuais. Pelos meados da década de 80,
continua a aproximação em matérias de carácter científico e cultural, alcançando
nestas um pico, em particular resposta à fundação da NAFTA e às próprias
mudanças referidas acima no estreito e contínuo projeto europeu. A título de exemplo em 1987 a criação do
Centro de Cooperação Industrial UE-Japão e em 1991 a ratificação de
uma declaração conjunta que deu início ao quadro que molda as relações atuais.
Esta breve análise contextual visa ilustrar e como citado
acima com o pragmático exemplo belga, as potencialidades que o tal último acordo
revela, numa contínua história com vastos capítulos e que revelam uma
aproximação com base numa dupla movimentação de focos e interesses cada vez
mais convergentes.
O intitulado “Maior Acordo Comercial do Mundo” ou em termos
técnicos o (APE) acordo de parceria económica UE-Japão entrou em vigor no dia 1
de fevereiro de 2019 e representa a maior área de livre comércio bilateral,
equivalendo a cerca de 1/3 do GPD global e 635M de pessoas. Ambos os lados comprometeram-se a intensificar
a liberalização e assim a contínua defesa do comércio global aberto, rejeitando
assim o modelo protecionista.
Para isso grande parte dos obstáculos que persistiam, foram
progressivamente eliminados, 97% a 99% das tarifas aplicadas às importaçõesJaponesas e europeias, respetivamente. Protege-se os direitos de propriedade
intelectual da UE e reconhece-se 205 Indicações Geográficas, por fim outros
entraves ao investimento e a entrada de empresas no mercado foram retirados, passando
o japão a consentir com as regras internacionais.
Cerca de dois anos depois, em 2021, o acordo é revisto
prorrogando 28 novas indicações geográficas e o comércio de vinhos e veículos é
facilitado. Representando cerca de 170 mil milhões de euros movimentados por
ano, e o crescimento nas exportações de setores chave para a União.
A nova reforma revela
que o acordo, em seu breve tempo, foi um sucesso, e também as intenções
conjuntas que caracterizam vários pontos das suas políticas externas.
Como já mencionado, este acordo, funda-se em valores sucintos
como a tolerância, a democracia e defesa dos direitos humanos, bem como em ações
conjuntas como atores globais e em instituições internacionais, também cooperam
entre si nas respetivas regiões, o japão contribui para a reconstrução dos
Balcãs, e a União no teatro asiático para manter a paz, executando uma
diplomacia de apoio, à prevenção e gestão de conflito, como na península da
Coreia, por exemplo nas relações entre o Japão e a Coreia do Sul, devido à 2ª Grande Guerra, não são “perdoados” mais de 100 anos de
história nem em plena pandemia.
Podemos também referir outros pontos de convergência, como
um foco deste último acordo ainda não mencionado, uma cláusula verde que
continua os esforços do acordo de Paris, que constitui um traço geopolítico forte nas estratégias de ambos, ambos procuram travar a dependência chinesa e o
seu crescente poder, por exemplo na questão de matérias primas, no entanto o
regime chinês aprecia monopólios, especialmente os que consegue controlar, seja
o digital ou o comercial, sendo outro
exemplo deste as disputas marítimas que mantem.
O acordo revela então o valor futuro do teatro asiático,
mas também o europeu, não só porque os futuros do Estado, dos grandes
espaços representam desafios bastante particulares, ou os vários problemas
económicos que ambos os lados atravessam, como os problemas de dívida que
condicionam os serviços públicos, sendo este um mecanismo de resposta,
conjunta, ao também agravamento internacional.
Por fim, a UE e o Japão dão um sinal tranquilizador, uma declaração de uma mudança na esfera internacional e nos tempos geopolíticos,
ambos defendem múltiplas alianças, sendo a UE o eixo de ligação, pois até já
substituiu o isolamento americano da última administração e ambos já publicaram
também visões estratégicas para o teatro agregador do índio-pacífico, com o
respeito pelo estado de direito a vigorar na região, bem como travando os
avanços contrários em suas respetivas regiões.
Este ensaio surge, assim, no contexto de uma ordem mundial
infetada pela pandemia do covid-19, e as necessidades acrescidas que tal
trouxe, onde o “liberalismo de Wilson” começa a perder a sua hegemonia,
enfrentando concorrência, autoritária e antiliberal. Numa resposta à Anarquia
Internacional, pois esta torna-se o que os estados fazem dela, tal como Wendt
refere.
Fonte da Imagem: https://jomatir.pt/my_uploads/2019/01/eu-japan-trade.jpg
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