ANDRÉ PEREIRA esclarece como o
Mundial de 2022 no Qatar, será o auge do Soft Power e da diplomacia desportiva contida
na política externa do país, que canaliza diversos investimentos no mundo desportivo,
ambicionando projeção internacional.
O Qatar é um país do Médio Oriente, reconhecido oficialmente como emirado, que apresenta no poder, a família Al Thani, a dinastia reinante desde 1825.
O Qatar predispõe de uma panóplia
de plataformas, que impulsionam o seu Soft Power, através de uma diplomacia
desportiva, enquanto instrumento de projeção internacional. Provas desta
circunstância, assentam no facto de o Qatar já ter sediado mais de 500 eventos
desportivos impactantes nos últimos 15 anos, na sua aposta em fomentar uma
tradição desportiva de renome e na canalização de investimentos para erguer
infraestruturas de treino, de recuperação e de medicina desportiva. Em suma
trata-se de um recente culto desportivo.
A realização do Mundial de
Futebol FIFA em 2022 é, até ao momento, o culminar de uma estratégia inserida na
Visão
Nacional do Qatar para 2030, um programa de afirmação à escala global, que
pressupõe o controlo do seu progresso enquanto Nação, almejando critérios
sustentáveis e o prosseguimento de uma marcha que proporciona um alto padrão de
vida à sua população.
É factual, que assim que o Qatar
venceu a candidatura para ser o anfitrião do Mundial, as atenções do Globo viraram-se
para o Golfo Arábico. Se durante todo o processo reinou uma desconfiança
generalizada, a verdade é que o Qatar empreendeu, no meu ponto de vista, uma
abordagem estratégica que emprega o desporto, como um veículo para o exercício
de relações públicas. Os pilares
desse conceito estratégico percorrem 4 aspetos estruturais.
O primeiro angaria dimensão, nos
avultados investimentos que o Qatar tem proliferado nos grandes centros do
desporto. Basta salientar que, por meio da sua companhia aérea, já patrocinou
colossos desportivos como a AS ROMA, o Bayern de Munique ou até o Barcelona. Por
outro lado, a instrumentalização desportiva pelos meios de comunicação social,
é atingida com um canal catariano inteiramente ligado ao desporto, que está a
dominar os direitos televisivos de transmissão das principais competições do
Médio Oriente e do Norte de África. Seguidamente, o Qatar tem vindo a
estabelecer-se como um palco de destaque de eventos deste calibre, como os
Jogos Asiáticos em 2006, o Mundial de Andebol em 2015, o Mundial de Ciclismo em
2016, o Grande Prémio de Losail ou o Mundial de Clubes de Futebol em 2021. Ressalvo
ainda a diplomacia
desportiva do Qatar enquanto continuação da política sob a forma de outros
mecanismos.
Não existem dúvidas em como o
desporto é uma ferramenta
(página 359) unificadora, que efetua pontes entre as nações, e que, em caso de
sucesso da ocorrência, promove uma profícua reputação.
Mas afinal, o que é que de tão
majestoso liga o desporto e o Qatar? A resposta entronca no Soft Power. O Qatar
sentiu a necessidade de reconhecer a sua posição no cenário universal, cortejando
o ocidente e dirigindo verbas dispendiosas no domínio desportivo.
O verdadeiro “playmaker”, por
detrás do Soft Power, remete para o equilíbrio do poder na negociação,
isto é, o Qatar paga atualmente algumas dívidas, a um dos clubes mais
prestigiados do mundo: o Barcelona, sendo ainda o acionista maioritário do Paris-Saint-Germain.
Vemos então, que o Qatar usa o desporto para obter uma influência
global.
A diplomacia desportiva funciona?
É provável. O desporto incorpora amizade, é um invólucro protetor do respeito,
da tolerância e de outros valores considerados ética e moralmente corretos. No
fundo, o desporto é uma avenida pública de harmonia.
O fenómeno do “desporto – global”
do Qatar e a Copa do Mundo em 2022 são um presságio do Soft Power, mas também
do disempowerment,
uma forma de regenerar a longo prazo, o seu Soft Power.
Este último argumento, desagua na
localização do Qatar e na crise do Golfo, que resulta
de uma competição acirrada de Soft Power na região, que despoletou em 2009,
com o primeiro passo do Qatar rumo ao acolhimento do Mundial 2022. No Médio
Oriente, o futebol tem sido a embraiagem
da indústria desportiva, servindo como locais de expressão e de efeito político.
E o interessante, é a abordagem multidisciplinar
que o desporto está a produzir na academia e na política externa do país,
instituindo um legado
com objetivos alargados na manutenção da popularidade do Qatar e da sua
segurança nacional.
Tornou-se assim tão elitista o
desporto no Qatar? Aquilo que posso comentar é que o Qatar, que nunca foi uma
potência desportiva, começa agora a obter alguns resultados
internacionais interessantes. No ranking das melhores cidades desportivas, o
backstage das glórias internacionais, Doha aparece colocado na 25ª posição,
(página 4) tendo pela frente fóruns desportivos com grande tradição, como
Boston, Lausanne, Paris ou Manchester. A visão do Qatar para o Mundial 2022 é a
de fornecer uma identidade
(página 10) internacional a um ordenamento jurídico reduzido. Tudo se resume ao
pacote do Soft Power, às
suas estratégias, recursos e desfechos esperados (página 7).
O Mundial 2022 no Qatar tem
permitido sucessivos prémios de inovação ao país e packs de soluções
tecnológicas, para a organização
logística e para a implementação do torneio. Com efeito, o investimento
no sucesso desportivo revela configurar um traço positivo na política externa
do Qatar, o que julgo constituir um preceito de que a política externa é o
verdadeiro motivo
pelo qual o Qatar está a sediar o Mundial de Futebol, no esbarrar de uma interseção
clara entre política e futebol.
Perigoso será, se uma crise
desportiva colocar em causa
a diplomacia do Qatar. Se analisarmos a política
externa do Qatar, reparamos que o papel do Qatar nas relações
internacionais é profundamente condicionado
pela geografia, pelo seu dilema da segurança interna e pelo confronto elitista
estrutural na região.
Os média do ocidente agregam uma agenda
direcionada para o Qatar, sobretudo quando ecoam conceitos de migração de mão-de-obra
desportiva, de atletas recrutados sem qualquer atenção ao critério
da nacionalidade e à escravatura
na construção dos suportes infraestruturais ao evento de futebol.
O Qatar parece ser um caso de
sucesso ao jogar com o Soft Power desportivo. Resta saber se, o “Síndrome
da FIFA”, por “ambições
petroleiras”, foi o impulsionador obscuro desse painel.
O que eu perfaço, é que o Qatar
quis, e continua a querer. Mais desporto, mais prestígio, melhor turismo,
melhor projeção. O Qatar sonhou, continua a sonhar. Comprou o PSG e negoceia
para o seu mercado interno com os melhores atletas da atualidade. Estando toda
a equação descrita, a obra nasce. O desporto nasceu no Qatar, já faz alguns
anos, mas em 2022, a coroa que pertence ao desporto-rei, estará junto à família
Al-Thani.
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