EDUARDO SILVA analisa a importância do recente ataque ao Solarwinds e o que pode implicar na cibersegurança global.
Em 2021 assistimos a uma emergência de uma política externa
digital com a crescente dependência tecnológica em todos os aspetos da vida humana
e dos Estados. Neste sentido, importa aos Estados combinar
na sua política externa a diplomacia ao fator digital (ver o caso mais recente
da Suíça),
devido a três principais fatores:
- Mudanças no ambiente em que a diplomacia é conduzida;
- Novos desafios de política externa, como a cibersegurança, privacidade e big data, cibercrime, e-commerce, entre outros;
- Ferramentas digitais como redes sociais, conferências online e big data analysis na prática diplomática.
Com a pandemia, em 2020, a interdependência
digital atravessou fronteiras, aumentou desigualdades e trouxe riscos
acrescidos para os quais a maioria dos Estados não estava preparado. Assim, sendo
um desafio global, a solução pode passar por um espaço
comum digital onde todos os atores do sistema internacional possam
trabalhar e debater em conjunto políticas que garantam que o uso da tecnologia
se mantém ao serviço da Humanidade. Este espaço tem vindo a ser preparado e planeado, nomeadamente
através da ONU.
É precisamente na formação deste contexto, transversal a
todos os envolventes do sistema internacional, que a dependência digital posiciona
a cibersegurança no centro das políticas externas dos Estados, por vezes como arma de "sharp power".
Recentemente, naquele que ficou conhecido como o Solarwinds
hack, muitas vulnerabilidades ficaram expostas a nível estatal nos EUA, mas também
empresarial em toda a cadeia fornecida por este software, que se estende a vários países e organizações. O mais impactante acerca deste ataque cibernético, alegadamente cometido por hackers ligados à Rússia,
foi o nível de sofisticação do mesmo, com acesso permanente, contínuo e
privilegiado a setores e informações cruciais do Estado americano, assim como o facto de só ter sido descoberto, acidentalmente, por uma empresa privada (FireEye), cerca de 1 ano após o início do ataque. As
consequências deste ato continuam em grande parte desconhecidas, no entanto
o seu alcance e profundidade vieram demonstrar como a cibersegurança é essencial
na geopolítica e estratégia dos Estados e como este novo domínio de ação dos
mesmos requer um acompanhamento por parte de normas e leis.
Deste modo, é possível falar em ciber-diplomacia,
isto é, o uso de recursos e funções diplomáticas para assegurar interesses
nacionais no ciberespaço. Nos últimos anos tem havido um aumento na
implementação de estratégias
nacionais com o objetivo de atender a este novo espaço da política externa.
Com um custo estimado em cerca de 1 trilião de
dólares, o cibercrime
em 2020 mostrou a importância da cibersegurança também
para o sistema financeiro. Até
2040 outras pandemias, ameaças cibernéticas e o conflito no espaço sideral,
são riscos que o mundo pode enfrentar. O risco cibernético
prende-se essencialmente em 3
pontos críticos que podem alterar/desestabilizar todo o sistema
internacional. São eles a quebra global do sistema financeiro, o colapso de
estruturas fundamentais e a vulnerabilidade associada aos sistemas de segurança
de centrais nucleares. Quanto à exploração espacial é claramente assente
em tecnologia e, seguindo a tendência competitiva
e militarizada que se tem verificado pelas maiores potências mundiais, é de
esperar que a cibersegurança
desempenhe um papel fundamental na defesa da mesma pelos Estados.
A linha que separa o ciberespaço da realidade física está a diminuir e implica desafios
cada vez mais complexos de cibersegurança. A fragmentada e pouco
consensual regulamentação que existe no âmbito, a interdependência global que
garante que o elo mais fraco da cadeia pode afetar as maiores potências, a
considerável falta de inteligência cibernética a nível empresarial e individual, assim como a dificuldade em identificar os autores dos ataques cibernéticos, diz-nos
que o que se passa no ciberespaço tem cada vez mais influência
no contexto geopolítico dos Estados. Aqui surge outro conceito que é o de ciberpoder ou, por outro lado, a medida da capacidade que um país tem de prosseguir os objetivos nacionais
através de meios cibertecnológicos.
Estamos numa fase de corrida pelas armas cibernéticas, pela estratégia ofensiva e militar. E está claramente em concordância com o aumento das ameaças, ataques
cibernéticos cada vez mais sofisticados (como o mais recente ao software
Solarwinds ou a questão do TikTok, em que ataques
cibernéticos efetuados por Estados passam por atos de espionagem devido à falta
de regulamentação objetiva). Deste modo o papel da cibersegurança na política externa dos Estados
será cada vez mais central. O recente hack ao Solarwinds é um alerta aos Estados e organizações internacionais
para um consenso global em torno de regras mais claras de governação
do espaço cibernético, mas também para uma melhor identificação das
vulnerabilidades em estruturas críticas dos Estados e sociedades, de forma a garantir que o mundo não continue como tem estado quanto à cibersegurança: "flying the plane as it still being built".
Fonte imagem: https://theconversation.com/cyberwar-is-here-to-stay-54938
Para melhor entendimento do ataque ao software Solarwinds: https://www.cbsnews.com/news/solarwinds-hack-russia-cyberattack-60-minutes-2021-02-14/
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